3 de setembro de 2013

O presente é generoso, é belo


Não se perca no corre-corre e na “seriedade” da vida. Não se extravie nas brumas do ego. Desfrute da simples respiração. Aprecie o presente maravilhoso da visão, o dom da audição, a afluência dos odores, a presença misteriosa dos seres. Mergulhe na poesia do mundo tal como ele se oferece continuamente.

Neste exato segundo em que lhe falo, qual a sua atitude em relação ao dom extraordinário da vida humana?

Deus nos dá tudo, absolutamente tudo, a cada segundo. Ele nos dá o dom do instante, porque só há o instante.

O certo é que não possuímos nada. Tudo, porém, nos é oferecido a todo momento.

E inútil apegar-se ao que quer que seja, uma vez que a existência está sempre disponível. Ao nos apegarmos a um objeto ou a uma qualidade particular da experiência, fugimos de todo o resto.

Há duas figuras do presente. Uma é infeliz, pois tudo escapa à sua apreensão, à sua vontade de reter. A outra se estabelece numa alegria eterna e incondicional. O presente feliz nada tem a reter pois tudo lhe é e será oferecido sem contrapartida.

A beleza lhe foi dada gratuitamente e você a recebe gratuitamente. Fora do cálculo perpétuo.

A superabundância do que lhe foi dado a cada segundo é entorpecente.

Nada lhe falta.

Busquemos tornar o mundo mais belo, para nós e para os outros. Isso implica superar a negligência, a preguiça, a ignorância, a desordem e a confusão. Podemos desenvolver a beleza, a destreza e a precisão em todos os aspectos de nossa vida: a cozinha, o vestuário, a decoração, a linguagem, o trabalho e as relações com os outros. Tudo o que fazemos deve ser bem feito. Quanto ao resultado de nossos atos, este não nos pertence.

Vá para o trabalho como se estivesse indo para seu primeiro encontro. Trabalhe como se estivesse fazendo amor (e não o inverso). Lave a louça como se estivesse contemplando as cataratas do Niágara. Faça as compras como se fosse um Rei Mago em dia de Natal. Descasque os legumes como se estivesse esculpindo Davi. Troque seu bebê como se estivesse realizando o primeiro transplante cardíaco. Preencha a declaração de imposto de renda como se estivesse compondo uma grande missa em ut (primeira escala musical). Recolha o lixo como se estivesse degustando um belo vinho.

O que a vida tem de mais extraordinário está nos momentos mais banais. Em qualquer momento. Agora.

Torne cada segundo de sua vida mais belo, mais poético, mais sagrado.

Há hoje uma espécie de frenesi de dessacralização. É preciso reconhecer o aspecto positivo dessa tendência: dissolver todas as formas de idolatria e de fetichismo. Mas não esqueçamos de que o esforço espiritual visa justamente ao objetivo inverso: tudo reintegrar no sagrado, cada átomo de existência, cada segundo de vida.

Ao descobrirmos algo de belo, não nos contentemos com seu sinal de beleza, seu brilho fugaz. Que a emoção da beleza, a admiração, a gratidão desabrochem em nossa alma. Abramos o coração para a beleza até nos tornarmos a própria beleza.

Tudo é belo.

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O Fogo Liberador - Pierre Lévy

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